Um best-seller erótico também se faz a partir de traumas sexuais. Ou, precisamente, de abuso infantil. É o que conta a americana Sylvia Day, conhecida pelos livros da série “Crossfire” – no Brasil, saíram três volumes: “Toda sua”, “Profundamente sua” e “Para sempre sua”. Em entrevista ao G1 por telefone, ela explica que a preparação prévia para escrever não envolveu necessariamente visita a clubes de trocas de casais ou atividades equivalentes.
“Comecei lendo livros. Depois, conversei com terapeutas especializados em abuso sexual”, recorda. “Pedi a eles que verificassem com seus pacientes se estes estavam dispostos a me contar suas histórias.” Sylvia chama essas pessoas de “sobreviventes”. Atualmente em turnê pelo Brasil para divulgar um livro de outra série, “Um toque de vermelho”, a autora esteve na Bienal do Livro do Rio.
O par central de “Crossfire” é formado pelo jovem Gideon Cross, descrito como “inteligente, bem-sucedido, rico e muito lindo”, e pela jovem Eva Tramell. Protagonizam cenas de sexo suficientemente ousadas e frequentes para render comparação com a trilogia da “concorrente” E L James, de “Cinquenta tons de cinza”.
Parecendo bem-humorada e rindo bastante, Sylvia diz entender a comparação, que justifica matematicamente: “Nossas séries venderam milhões e milhões de cópias”. Mas afirma entender que, como escritora, as duas sejam mesmo diferentes. Leia, a seguir, os principais trechos da conversa:
G1 – O acha da comparação entre você e a E L James, autora de ‘Cinquenta tons de cinza’?
Sylvia Day – Faz sentido, quando você pensa sobre o fato de que nossas séries de livros venderam milhões e milhões de cópias (risos). Quer dizer, muitas pessoas nos leram, então faz sentido.
G1 – Qual a principal diferença entre vocês duas?
Sylvia Day – Aí, depende do que você está falando. Se estiver falando das diferenças que temos como escritoras...
G1 – Como escritoras, claro.
Sylvia Day – Eu escrevo há dez anos, tenho mais de 40 livros, ou seja, é uma grande diferença com relação a alguém que tem três livros publicados. Tenho cerca de uma década de experiência, e ela é uma escritora bastante novata – esta é, provavelmente, a diferença mais óbvia entre nós. Já com relação ao que escrevemos, ela faz fan fiction [história de derivadas de outras que já existem; no caso de E L James, inspirada em “Crepúsculo”]. E eu não faço isso. Pessoalmente, não é o que está nos meus livros. São tipos de romances diferentes, acredito.
G1 – Você começou a escrever em 2003 e já tem 40 livros. Trabalha quantas horas por dia?
Sylvia Day – (Risos) Muitas horas! Na média, alguma coisa entre 12 e 16 horas. Todo dia.
G1 – Por que escolheu a ficção erótica? Você tem um método para escrever histórias eróticas atraentes?
Sylvia Day – Porque é que gosto de ler – a maioria dos escritores vão dizer a mesma coisa [sobre a opção pelos respectivos gêneros]. Como leitora, gosto de livros que têm conteúdo erótico. Mas não sou obsecada. Não mesmo. E não diria que existe uma fórmula. Mas, definitivamente, tenho uma assinatura.
G1 – Por que se interessa por personagens que sofreram abuso sexual na infância?
Sylvia Day – Porque acho que todo mundo merece ter uma vida feliz após o trauma, especialmente alguém que sofreu abuso de um jeito muito prejudicial. Quero escrever histórias de amor para essas pessoas. É muito satisfatório quando conheço leitores que me dizem: “Sou sobrevivente de abuso, nunca achei que fosse encontrar alguém, mas o seu livro me deu esperança...”. Histórias de amor não são apenas para pessoas perfeitas (risos).
G1 – Pesquisou sobre o assunto?
Sylvia Day – Sim, por anos, anos. Comecei lendo livros. Depois, conversei com terapeutas especializados em abuso sexual. Pedi a eles que verificassem com seus pacientes se estes estavam dispostos a me contar suas histórias, sabendo que eu era escritora e faria um livro.
Por meio dessas experiências – leitura de livros e conversas com terapeutas e pacientes –, uma das coisas que percebi é que um sobrevivente de abuso tem uma tendência a se aproximar de alguém que também é um sobrevivente. Então, na verdade o encontro entre Gideon e Eva [personagens de ‘Toda sua’] é bastante típico. Por alguma razão, sobreviventes têm uma espécie de sentido para se acharem – antes mesmo de contar um ao outro sobre as experiências do passado.
G1 – Você já disse que o sucesso depende de oferecer o livro certo na hora certa. Por que, afinal, este é o momento certo para o seu livro?
Sylvia Day – Neste caso, tenho de agradecer a “Cinquenta tons”. As pessoas ficam muito intrigadas com o tema... E, claro, tem o herói que sempre faz sexo com mulheres que se parecem com a mãe dele (risos). Isso chocava as pessoas. Uma vez que o assunto ficou conhecido, que muita gente estava lendo, as pessoas passaram a ir às livrarias e perguntar: “Qual é este livro do qual estou ouvindo tanto?”. Os vendedores deviam conhecer meus livros fazia dez anos, e recomendavam: “Olha, se você vai ler ficção erótica pela primeira vez, você deveria começar com Sylvia Day.”.
G1 – Quer dizer que despertou interesse em que não tinha o hábito de ler?
Sylvia Day – Realmente, porque estamos muito na TV, nos jornais, nas revistas, dando várias entrevistas. Quando falamos de “Cinquenta tons” e “Crossfire”, muitos desses leitores não são de fato leitores – quer dizer, muitas dessas mulheres não liam um livro havia muito tempo! Mas elas viram tantas menções na mídia, tantos artigos, tantas críticas em revistas, que pensaram: “Por que está todo mundo falando tanto sobre esses livros?”. Então, elas compram porque ficam curiosas.
G1 – Vai haver um filme ou uma série de ‘Crossfire’?
Sylvia Day – Sim. A Lionsgate, o estúdio que de “A saga Crepúsculo” adquiriu os direitos de “Crossfire”, e neste momento está sendo desenvolvido algo para TV a cabo, para um canal premium.
G1 – Você está escrevendo o roteiro?
Sylvia Day – Não, não. Sou consultora executiva. Vou ler o roteiro, mas não escrevê-lo.
G1 – Quem vai ser o Gideon?
Sylvia Day – Ainda não escalamos o elenco. Não tem um Gideon Cross oficial, mas Henry Cavill é um favorito dos fãs.
Sylvia Day no Brasil
Cachoeira (BA)
25 de outubro, na Festa Literária Internacional de Cachoeira
Fortaleza (CE)
29 de outubro, às 19h, na Saraiva do Shopping Iguatemi